5 de fevereiro de 2010

O que está acontecendo nos PIIGS da europa.


Eu morei alguns anos na Irlanda, onde tive experiência de primeira mão sobre a crise financeira, suas origens, e os desafios que a Europa enfrenta agora para sair dela.

Logo após a quebra dos bancos irlandeses, o governo de lá tomou a pouca sábia decisão de nacionalizar estes bancos, socializando o prejuízo destes bancos. Isso era algo já esperado, infelizmente, pelos próprios investidores que apostaram tudo já sabendo disso.

A surpresa, e a atitude mais correta, seria o governo ter deixado o problema atingir quem acreditou neste castelo de cartas, como aconteceu nos Emirados Árabes, e por falta de opção, na Islândia.

Mas não o fizeram. Rolaram a crise para alguns meses adiante, buscando ganhar alguns meses, como o fazem os políticos. Apenas pensam no curto prazo, como é natural com quem tenha um cargo eletivo.

Aos poucos, a sujeira em baixo do tapete começou a aparecer. Nada mais previsível. Não apenas na Irlanda, mas em outros países-membros em situação análoga. A deterioração das contas públicas apareceu rapidamente, em um novo cenário onde ninguém mais aceita comprar títulos destes países pagando as mesmas taxes de antes.

A Grécia é o em pior situação, seguida de Irlanda, Espanha, Portugal, Itália. São países que apresentam aquela mania tão comum na américa latina, de aceitar e até esperar que o estado gaste mais do que pode, e de jamais fazer cortes. São os países do PIIGS, os porquinhos na casa de palha da Europa.

Recentemente, o mercado se convenceu da absoluta incapacidade do governo grego de fazer os ajustes necessários à nova situação, e o mercado passou a especular contra os títulos gregos. O spread em relação aos títulos da alemanha já chega a 4%. E todos os países com problemas fiscais estão vendo este spread aumentar.

Não se discute muito sobre as dificuldades técnicas da implantação do Euro. Nem mesmo na Europa. Muitos investidores e observadores dos mercados tratam o euro como se fosse uma moeda normal. Não é bem assim.

O euro é uma iniciativa inédita de criação de um frankenstein monetário. Uma moeda política, como toda moeda hoje, emitida por banco central, e não lastreada em ouro ou outra commodity. Mas, diferentemente das outras, é emitida por vários países diferentes, em situações fiscais diferentes.

E há muito pouca vontade política de fazer uns pagarem pelos erros dos outros. Porque uns estão majoritariamente no país X e outros no país Y. Já quando todos estão envoltos pela retórica nacionalista, se torna a coisa mais comum do mundo um pagar pelo outro, e inventam mil justificativas para isso.

Mas socializar os erros cometidos por estrangeiros é algo que nunca pega muito bem na opinião pública.

É um assunto complicado este da moeda fiat, que pretendo tratar em outros posts neste blog. Mas por enquanto basta observar que a autoridade monetária européia aceita como colateral para a criação de euros, uma grande variedade de títulos de governos europeus, cuja qualidade obviamente varia.

Em suma, um euro português é o mesmo que um euro alemão. Mas o banco português deposita no ECB um título de pior qualidade. Para manter a distorção sob controle, a UE estabelece parâmetros fiscais, que aparentemente foram observados por estes países apenas até a entrada no euro. Com estes spreads aumentando e estas contas deteriorando, os países mais sólidos acabam tendo que socorrer os 'porquinhos', ou correr o risco de ver a crise fiscal destes países se tornar em uma crise do euro, e ver o lobo mau começar a soprar as casinhas de madeira...

Mais sobre este assunto no Financial Times, é claro. Perco meu tempo lendo jornais brasileiros, e que eu saiba, nenhum noticiou este importante desenlace da crise.

Nenhum comentário: