30 de março de 2010

Preço do minério de ferro passa a ser negociado em tempo real

O Financial Times noticiou hoje uma mudança técnica importante no mercado de minério de ferro. A negociação do minério era baseada em contratos anuais, e passa agora a ser conduzida por um sistema de mercado com cotações em tempo real, como é comum com outras commodities.

Como é comum em economia, isto tem tanto vantagens quanto desvantagens potenciais para os consumidores e as empresas de minério de ferro. Mas no curto-prazo e em um cenário onde o preço do mercado spot está sempre mais alto, irá beneficiar bastante as mineradoras, especialmente as australianas, que já estão perto do mercado consumidor.

29 de março de 2010

Dilma critica 'neoliberalismo' e exalta o 'estado indutor'


A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, voltou a criticar o governo anterior em seu discurso na cerimônia de lançamento do PAC 2. Ela disse que, no Brasil, existiram três modelos de Estado. O primeiro, na década de 50, era o Estado produtor, que atuava diretamente na economia e às vezes era autoritário. O segundo "foi o Estado mínimo do neoliberalismo que nos antecedeu". O "Estado do não", enfatizou. "Não havia Planejamento estratégico, não havia crescimento de investimento público e não havia parceria com a iniciativa privada". "Foi um Estado omisso", acrescentou.

O terceiro modelo do Estado brasileiro, segundo a ministra, foi implantado durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva. "É o do Estado indutor, regulador, que cria condições para que os investimentos sejam feitos e cobra". Segundo a ministra, esse modelo respeita a iniciativa privada, não abre mão do desenvolvimento, mas garante a estabilidade macroeconômica. A regra central, segundo a ministra, é que o desenvolvimento ocorra com distribuição de renda. "Três expressões renasceram no governo Lula: planejamento, investimento e desenvolvimento com inclusão social. Deixamos para trás décadas de improvisação".

Comento: Observa-se na verdade apenas dois modelos. O da década de 50, ao qual Dilma quer retornar, é aquele no qual o estado gastava os tubos para realizar os projetos desenvolvimentistas dos seus idealizadores. O que, por sua vez, levou a uma total crise fiscal. O que, por sua vez, nos levou à hiper-inflação, que é como um estado quebrado paga as suas contas.

Finalmente, com Fernando Henrique e seus antecessores passamos por uma época bastante conturbada de ajustes fiscais, no qual medidas liberalizantes fizeram parte. Sem isso, o estado jamais poderia rolar sua dívida sem recorrer ao truque diário da hiper-inflação. E o mais irônico é que sem estes ajustes liberais eles não teriam grana hoje para fazer demagogia e plano de metas no estilo anos 50.

E depois das crises asiática e do México, depois da quebra da Argentina, veio o mega-boom, no qual o Brasil entrou atrasado. E agora estão podendo gastar os tubos novamente. Para quem sabe, daqui a uns meros 10 anos, as contas públicas entrem em um colapso total que forcem mais um ciclo de reformas.

Moral da estória: lucrar e gastar com os ajustes feitos pelos outros e falar mal do 'neoliberalismo' é fácil. O PT, sabendo que a maioria da população é ignorante, não se preocupa com questões fiscais, vende uma idéia insustentável do estado gastador sem peso na consciência. Porque quem paga imposto conscientemente por aqui é uma minoria.

Um 'estado indutor' seria um estado que colocasse as regras do jogo para a iniciativa privada entrar. Parece que é esse peixe que ela quis vender. Mas o governo deles passou muito longe disso, pois a tentação do petista governar como uma junta militar é muito grande. E inclusive regulando costumes e liberdades pessoais, que os militares faziam em nome da 'moral de dos bons costumes'. Um retrocesso e tanto.

Muita gente ficou rica na época com contatos entre empresas e governo autoritário, e não tenho dúvidas que este é o modelo almejado pelo PT.

25 de março de 2010

Antes tarde do que nunca

Quem já mexeu com câmbio profissionalmente ou mesmo para viajar para outro país sabe o quanto esta área é complicada no Brasil, com seus inúmeros controles que foram criados em uma época em que o Brasil tinha uma moeda fraca e manipulada, como é atualmente na Venezuela, Argentina e Cuba, e em uma época que o único local adequado para estes ativos era na mão do 'el presidente', na mão do estado.

Na mão dos outros era crime. A população era obrigada a usar a moeda local, que se desvaloriza'va em um ciclo inflacionário, enquanto a elite política se beneficiava do acesso privilegiado à cotações especiais, enriquecendo bastante os aliados e os conectados e privilegiando projetos de estimação às custas dos outros participantes do mercado de câmbio.

Tudo isto não funciona sem muita burocracia e complicação. E mesmo com todo controle do mundo, é normal que as ovelhinhas tentem escapar do garrote, e vemos até hoje no Brasil um grande mercado informal de troca de moeda não autorizada pelo estado.

A situação da moeda mudou bastante no Brasil. O setor bancário é melhor que a média e mesmo a moeda brasileira não está mal, mesmo comparada às majors. Se a administração do BCB continuar como foi nos últimos anos, o caminho do Real é se tornar uma major.

Entretanto, todos os controles daquela época triste de 'cruzados novos' continuaram nos atazanando.

Até hoje no Brasil para um gringo trocar uns dólares ele precisa apresentar CPF (vai explicar para o burocrata brasileiro que isso não existe ) ou seu passaporte (vai explicar para o burocrata brasileiro que passaportes são roubados e é um trabalho para fazer outro ). Isso até para quantias mínimas, como trocar 100$. Eu já passei por isso.

Outra novela com Western Union e transferências bancárias internacionais. Vai ter que levar documento, xerocar, tirar cópia de tudo e JUSTIFICAR para o Banco Central do Brasil. Um verdadeiro absurdo. E o mais engraçado é que o Western Union, por exemplo, trabalha sem muitos problemas em muitos países do mundo, e mesmo em países com uma estrutura mínima.

E, o mais engraçado. Você não encontra uma pessoa capacitada nos bancos brasileiros para te dar informação confiável nesta área. É tão enrolado que nem eles mesmos sabem como é. E a maioria das pessoas não usa - também porque é tão complicado que nem tentam.

Pois o Banco Central do Brasil sabia destes problemas, e tinha gente trabalhando nos últimos anos para desenrolar este incrível emaranhado burocrático, e elevar a base jurídica do país nesta área ao padrão internacional. Não deve ser um trabalho fácil. Mas é tarefa de extrema importância para o desenvolvimento da economia brasileira.

17 de março de 2010

Um investimento de porte

O bilionário brasileiro Eike Batista se prepara para fazer um grande investimento na região de Biguaçu, e provavelmente será o fato de maior repercussão econômica da região da grande Florianópolis em muito tempo.

Entretanto, investidores estrangeiros estão cautelosos. A oferta inicial de ações teve seu preço-alvo abaixado. Como é possível que uma área saturada no mercado mundial, como a de estaleiros, possa ser um bom investimento?

Este analista do MSN money explica porque:
http://articles.moneycentral.msn.com/Investing/top-stocks/blog.aspx?post=1674498

Em suma, a OSX, mesmo antes de sair do papel, já terá contratos garantidos das gigantes Vale e Petrobrás, com grande influência do governo e do BNDES para encher a agenda da OSX de encomendas. Um típico capitalismo brasileiro, este de Eike.

Em todo caso, se o Brasil perderá com mais essa - mas na crença geral, ganhará, a nossa região certamente ganhará, e muito. Não é o caso de jogar água fria, pois a economia da região certamente vai decolar.

Mas olhando fora do nosso pequeno mundinho, há alguns problemas sérios com a idéia de fundar um estaleiro no Brasil. O mercado internacional nesta área está saturado, atingindo o pico antes da crise mundial. As encomendas para cargueiros de minério e petróleo estavam lotadas por vários anos.

Nesta época deve ter soado o alarme na sala dos planejadores econômicos do governo, e eles decidiram que deveria ter fabricação de barcos de grande porte no Brasil e fim de papo.

Agora, a coisa é bem diferente. Uma das maiores bolhas antes da crise estourar foi a do transporte mundial, que pode ser medida com o Baltic Dry Index. O número de navios de grande porte que fazem o comércio mundial é relativamente pequeno. Leva vários anos para fazer um cargueiro destes, e então a área era um dos indicadores da crise.

Depois do estouro, o preço do transporte caiu, e os estaleiros começaram a ter problemas. É uma área extremamente sujeita ao ciclo monetário, pois é um bem de capital envolvido no transporte de uma matéria prima, ou seja, lá no começo da cadeia produtiva.

Então, o problema das encomendas está resolvido. Há demanda interna e a OSX aparentemente será capaz de mexer os pauzinhos para que estes contratos fiquem por aqui.

Sabendo que na região não há profissionais desta área, apenas construção de barcos menores em Itajaí, a OSX pretende contar com assessoria técnica da Hyundai coreana. A Coréia do Sul concentra os gigantes deste setor. Eles já pensaram em tudo.

Em uma tentativa anterior de passar contratos da Petrobrás para estaleiros no estado do Rio, a coisa se converteu naquela clássica piada bastante contada no Brasil: 100 pra mim, 100 pra você e 100 para o 'coreano' fazer o serviço...

O empreendimento de Eike Batista até pelo porte não é deste tipo. Sabe que ajuda e influência estatal pode inflar suas velas, mas não para sempre. Espero sinceramente que este empreendimento, a exemplo dos 'chaebol' coreanos, possa se livrar da sina fatal que geralmente ronda qualquer empreendimento que surge como oportunidade política mais do que de mercado.

16 de março de 2010

Serra defende 'estado ativo' como sua plataforma


Comento: O modelo de estado de Serra e o do PT tem muito em comum. Não é de agora que petistas vêem o PSDB como seu maior adversário justamente por esta semelhança de propostas.

O modelo defendido pelos dois partidos é atrasado, e coloca o país no rumo de ideologias abandonadas no resto do mundo lá pela década de 70. O modelo do PT é mais perigoso pois é combinado ao 'DNA autoritário' que o PT possui, enquanto o PSDB se coloca mais como herdeiro do socialismo democrático europeu. O PSDB é reformado, o PT não é.

Como se sabe lá fora, o socialismo democrático na europa aceita privatizações de áreas não fundamentais para o estado focar no que eles consideram a missão fundamental do estado: assistencialismo e rede de proteção social. E como se sustenta isso? Com um setor privado vigoroso o suficiente para ser sugado.

Infelizmente aqui no Brasil este socialismo democrático estilo 'Tony Blair' foi pintado como 'neoliberalismo', e por algum impulso do brasileiro em acreditar no estado ativo, mesmo contra todas as evidências, a desinformação se espalhou e colou no PSDB. E agora o partido busca, com Serra, disputar o eleitor do PT.

Serra é desenvolvimentista. Para ele, a função do estado extrapola a do estado social-democrata europeu. Além de assitência social, é função do 'estado ativo' meter o nariz em todos os setores da economia. O que isso significa é propositalmente mantido no escuro. Geralmente significa um grande poder de intervenção econômica à discrição do presidente da república. Tivemos uma mostra disso nas medidas do governo Lula durante o início da crise. Decretos contemplando setores especiais, cortes de impostos para setores especiais. O BNDES se inchou. Nada desconfortável na ideologia deles, onde o estado seria a 'mola propulsora', usando parte dos salários dos trabalhadores para investir naqueles investimentos que os burocratas do governo consideram essenciais.

Se o estado é ativo, subentende-se uma sociedade passiva. Como pode uma sociedade passiva controlar o 'estado ativo'? Como pode o poder não se corromper se todos os grupos que poderiam controlá-lo vão necessitar da simpatia do 'estado ativo'?

Os marqueteiros são familiares com estes anseios irracionais dos eleitores brasileiros. A campanha eleitoral vai continuar se desenrolando fazendo não propostas políticas para uma sociedade madura, mas prometendo a felicidade pintada em verde-amarelo, para uma sociedade infantilizada e com carência paterna. Se houvesse algum candidato que representasse uma proposta mais liberal, seria a hora de propor um estado subordinado à sociedade, e não o contrário.

12 de março de 2010

O Fiscal do Fiscal e o Combate à Corrupção

Por:João Rogério Sanson*

Freqüentes denúncias de corrupção, de todo tipo, têm convulsionado o Brasil pelo menos desde os anos 1990. São políticos acusados de locupletação com recursos públicos, juízes que se envolvem com quadrilhas especializadas em desvio de dinheiro público ou em outras atividades ilegais, policiais ligados ao tráfico de drogas e empresários e outros interesses privados que corrompem a máquina pública. Se os criadores e os guardiões da lei aparecem como corruptos, a pergunta que fazemos é: o quê fazer para que isso não ocorra, ou, pelo menos, para que seja diminuído a níveis comparáveis com países conhecidos como de baixa corrupção?
A solução mais óbvia é criar esquemas de auditoria. Mas aí surge o problema do fiscal do fiscal. Assim, o policial fiscaliza o cidadão, o corregedor fiscaliza o policial, o juiz fiscaliza o corregedor, e aquele é fiscalizado por alguém, e o processo terá que parar em alguém mais acima. Isso lembra a história de um nativo que tinha uma visão cosmológica conflitante com a moderna astronomia. Segundo a visão nativa, a terra é um grande disco apoiado sobre um grande elefante. Quando perguntado sobre qual a base de apoio do elefante, ele diz que é uma grande tartaruga, que por sua vez está apoiada sobre muitas outras tartarugas, num amontoado sem fim. Para o nativo, é inconcebível que a terra esteja vagando pelo espaço, sem nenhum apoio físico. Uma imagem mais antiga é a do deus grego Atlas, às vezes desenhado com o planeta Terra nas costas, embora ele, na verdade, tivesse que segurar os céus. Essa concepção divina presumia a terra como centro do universo, servindo então de base para Atlas.
Na questão do fiscal do fiscal, seguindo a hipótese das tartarugas, seria preciso encontrar um fiscal de última instância. Uma das opções antigas era o grande líder político com poderes absolutos. Outra opção era tornar essa solução mais permanente, e atribuir essa função a deuses, que em muitos casos tinham também um líder. Nas sociedades mais recentes, esse papel é em geral atribuído ao Poder Judiciário. Esse poder tem a função de verificar o cumprimento das leis, incluindo uma lei maior, a Constituição. Mas há ampla evidência histórica de que, em ambientes autoritários, mesmo a Constituição não está a salvo de mudanças convenientes para o grupo que controla a sociedade naquele momento, podendo levar a sociedade a um ambiente de alta corrupção. Portanto, o Poder Judiciário e a Constituição, num horizonte temporal mais longo, não preenchem a função de fiscal do fiscal.
Antes de seguirmos para formas mais específicas de controle das decisões da sociedade, precisamos definir mais claramente o que entendemos pelo termo corrupção, embora isso seja como o caso de um pato, que não é muito fácil de descrever, mas sobre o qual todos temos uma idéia razoável do que seja. Uma definição possível é dizer que a corrupção ocorre quando indivíduos, agindo isoladamente ou em grupos, obtêm benefícios privados às custas de recursos públicos por meios proibidos pela lei. Mas pode ser também entendida apenas como formas de benefícios privados inaceitáveis pelas crenças compartilhadas por uma dada sociedade, muitas vezes ainda não capitulados na legislação.
Como conseqüência de tais atos, ocorre redistribuição de renda, muitas vezes para minorias já bem postas em posses. Instala-se, além disso, um ambiente inadequado para a divisão social de trabalho, levando a atrasos no desenvolvimento econômico. Decisões de investimento são atrasadas, com queda de rentabilidade, devido à exigência de pagamento de propinas em dinheiro ou em benefícios materiais. De outra parte, corruptos muitas vezes criam dificuldades para vender facilidades. E devemos notar que isso independe de se tratar de uma economia de mercado ou de uma economia centralizada, como as da era do socialismo real. Por conta disso, até já se constatou que a corrupção, uma vez criadas essas dificuldades geradoras de propinas, é uma forma de agilizar processos e, assim, obter mais agilidade nas decisões, contribuindo para o desenvolvimento econômico.
Naturalmente, as grandes organizações privadas não estão imunes a essas questões. Contudo, a diferença é que, em ambientes de concorrência, essas organizações têm sua sobrevivência comprometida no longo prazo por conta de seus maiores custos e da maior lentidão em suas respostas à mudança de circunstâncias. O setor público, por natureza, tende ao poder de monopólio nos serviços que fornece à sociedade, o que, na ausência de mecanismos sociais alternativos, dá uma sobrevida a tais problemas.
Soluções práticas para combater a corrupção e outros problemas de natureza política têm sido adotadas ao longo da história humana. Uma dessas soluções é justamente a divisão de poderes do governo, com uma divisão de trabalho entre atividades executivas, legislativas e judiciárias. Assim, os poderes são relativamente independentes. Mas o Executivo presta contas formalmente ao legislativo, cabendo aos Tribunais de Conta o papel de verificar se a legislação vigente foi cumprida na execução dos orçamentos. O Judiciário aplica a lei, e isso funciona como fiscalização,
inclusive de si próprio. O topo do Judiciário é escolhido pelo Executivo. Mas os membros do Executivo e do Legislativo são escolhidos, e assim fiscalizáveis, pelos eleitores.
Por conta de origens históricas, quando as unidades políticas eram anteriormente independentes, temos organizações federativas, em vários níveis. No caso brasileiro, na verdade, o regime federativo, com três níveis, decorreu de uma redução dos poderes centrais, com aumento de autonomia dos governos provinciais e municipais. Foi construído como solução política para evitar o fracionamento do país, tendo em vista as várias revoltas regionais. Em regimes federativos, a divisão de poderes e a eleição de membros do executivo e do legislativo é a regra. Em alguns países, membros do judiciário local são também eleitos.
É essa prerrogativa dos eleitores que representa a função fiscalizadora dasvárias partes que compõem a máquina governamental, em seus poderes e níveis. A força dessa fiscalização, no entanto, parece bastante fraca, uma vez que só periodicamente o eleitor diz sim ou não a cada candidatura. Mesmo assim, nas propostas dos candidatos estão embutidas tanto as despesas prometidas como a tributação correspondente, embora nem sempre de forma explícita, junto com propostas de mudanças institucionais.
Num ambiente de alta concorrência política e com informação perfeita, o próprio processo político leva a que as preferências da maioria dos eleitores sejam atendidas. A própria presença de muitos partidos políticos e a descentralização do governo em níveis locais pode, em princípio, garantir o atendimento das preferências de minorias. Esse raciocínio de Joseph Schumpeter, elaborado em meados do século XX, é uma generalização do argumento de Adam Smith, de quase duzentos anos antes, quanto ao papel da concorrência entre empresas no atendimento às demandas de bens privados. Segundo Smith, não apenas os capitalistas atendem as preferências dos consumidores, como a concorrência conduz ao lucro puro nulo, que às vezes descrevemos, em linguagem alternativa, como um lucro normal ou justo.
Na política, a concorrência entre os profissionais da política também leva ao atendimento das preferências dos eleitores junto com a diminuição de ganhos excessivos que o exercício do poder proporcionaria. A diminuição da corrupção vem junto. A concorrência política é a característica que pode tornar o exercício do voto o fiscal dos fiscais. Por conta dessa concorrência, os políticos de oposição são induzidos a expor os problemas aos eleitores e ao Judiciário. Este define as penas nos casos em que há evidência judiciária, e o eleitorado diz não a tais políticos. O fiscal dos fiscais é, em última instância, o eleitor, embora o sistema político dê a impressãode ficar suspenso no ar, vagando de eleição a eleição, sem ninguém que o controle. Embora um voto isolado tenha uma influência insignificante, a soma de todos os votos tem uma força descomunal.
Mas a informação é imperfeita, e muitos políticos conseguem enviesar a distribuição de poder em seu favor. Adivinhe qual é uma das justificativas para enfeixar mais poder? O perigo de deixar o sistema político funcionar livremente. Um dos argumentos preferidos dos militares no golpe de Estado de 1964 era justamente o alegado excesso de corrupção existente na área pública, sem contar as ameaças externas no contexto da Guerra Fria e as contas de décadas anteriores a acertar entre os militares e os civis. A imagem propagada era que a corporação militar, então com uma imagem de incorruptível, junto à população, seria o fiscal dos fiscais.
O problema da informação imperfeita torna as decisões dos eleitores mais difíceis, pois os custos de obtenção de informação tomam tempo e renda. Os eleitores optam pelo uso de indicadores indiretos para saber o que pretendem os políticos, que se organizam em partidos e agem como empresas que vendem serviços de representação dos interesses dos eleitores nas decisões nacionais públicas. Associam, a seus partidos ou a seus líderes, imagens parecidas com as marcas usadas pelas empresas em seus produtos. Um termo usado por Antonio Gramsci, em sentido mais amplo (SIMIONATTO, 1995, cap.1), é ideologia, que Anthony Downs restringiu à competição partidária. É o que dá uma cara ao partido, diminuindo custos de informação ao eleitor.
Alguns países, com democracia consolidada, têm dado status especial à imprensa falada e escrita justamente por ser um instrumento automático de diminuição de custos de informação. É uma atividade comercial como qualquer outra e se encaixa nos argumentos smithianos quanto à concorrência. Assim como o feijão e o arroz para os brasileiros, a informação da imprensa é também uma mercadoria essencial. O ideal para os políticos é sempre ter uma imprensa a favor. A concentração nesse mercado pode converter-se em concentração do poder de influência política na medida em que certas informações sejam restringidas.
O problema do poder de mercado político é também uma limitação ao funcionamento do processo, embora em certas circunstâncias, como, por exemplo numa guerra, uma sociedade democrática possa dar poderes adicionais a seus líderes. Um caso interessante, mas já antigo, é o de Winston Churchill, que embora tivesse cometido sérios erros em decisões políticas nos anos anteriores à Grande Depressão, mostrou-se o político adequado para comandar os ingleses na luta de vida e morte contra o nazismo. Mas assim que a guerra terminou, os eleitores o mandaram para casa, pois as instituições políticas o permitiam. Ao mesmo tempo, Getúlio Vargas, que era um governante autoritário durante a mesma guerra, foi para casa como conseqüência de um golpe de Estado.
Assim como nos mercados, os governos autoritários também respondem aos interesses dos cidadãos, mesmo que consigam controlar as eleições. Apesar de a imprensa ser sufocada ou colocada a serviço do regime, muita informação ainda passa por outros meios. É aqui que aparece outro elemento importante do processo político com pouca ou nenhuma concorrência política e informação imperfeita: os grupos de interesse. A concorrência também ocorre entre tais grupos, dos quais os empresários são apenas um subconjunto. São eles que podem obter vantagens decorrentes do poder político concentrado, mas, ao mesmo tempo, concorrem entre si, como argumentou Arthur Bentley no início do século XX. Embora o tempo de ajustamento seja muito mais lento do que numa democracia, e os ajustamentos se mostrem sujeitos a períodos de alta instabilidade, ao final ele ocorre. É como se a Terra tivesse uma trajetória um pouco errática no espaço, mas tendendo à estabilidade, o que possivelmente deve ter ocorrido quando de sua formação. O sistema político continua a funcionar sem precisar de um fiscal dos fiscais. Os políticos de governos autoritários que pretendem fazer isso têm vida relativamente curta, e poucos conseguem manter esse papel durante toda sua vida, o que nem sempre ocorre por seus próprios méritos.
Do ponto de vista da corrupção, um elemento adicional é a cultura ética da sociedade, muitas vezes embutida em princípios religiosos. Aliás, em sociedades antigas, a divisão de trabalho entre religião e política era mínima, assim como havia pouca competição entre as religiões. Princípios éticos embutidos nas instituições e compartilhados por todos ajudam a diminuir a corrupção, mas precisamos investigar como a sociedade internaliza tais princípios.
Em geral, há uma longa evolução das instituições, com sistemas de incentivos para adoção de tais princípios. Podemos, por fim, voltar ao caso brasileiro. A evidência crescente de problemas de corrupção e de descontrole institucional em alguns setores, segundo a visão aqui apresentada, é, na verdade, uma evidência de que o processo político democrático está funcionando e de que os cidadãos brasileiros mostram crescente intolerância com tais atividades. A concorrência política é o fiscal dos fiscais e é ela que está em funcionamento. Não precisamos de elefantes e nem de grandes tartarugas para tal função.

Referências Bibliográficas
BENTLEY, A. F. The Process of Government: A Study of Social Pressures. Chicago: The University of Chicago Press, 1908. Livro baixado de: www.archive.org.
DOWNS, A. Uma Teoria Econômica da Democracia. São Paulo: Ed. USP, 1999. Original em inglês, 1957.
SCHUMPETER, J. A. Capitalism, Socialism and Democracy. 3.ª ed. New York: Harper & Row, 1950. Primeira edição, 1942.
SIMIONATTO, I. Gramsci: Sua Teoria, Incidência no Brasil, Influência no Serviço Social. Florianópolis: Ed. da UFSC; São Paulo: Cortez, 1995.
SMITH, A. Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações. 2.ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979. (Os pensadores.) Original em inglês, 1776.

* Professor do Departamento de Ciências Econômicas da UFSC. Este artigo foi escrito com base em anotações para a palestra intitulada “O fiscal dos fiscais: a concorrência política”, durante a XXXI Semana do Economista, numa promoção conjunta do Conselho Regional de Economia do Estado do Mato Grosso (CORECON-MT) e da Universidade Federal do Mato Grosso, realizada em Cuiabá em 2005. O autor agradece os comentários recebidos na ocasião.

11 de março de 2010

Uma vitória que é uma verdadeira derrota

O leitor do Globo Adolfo Sachsida escreveu uma análise lúcida e bem embasada do episódio da retaliação comercial autorizada pela OMC e implementada com gosto pela CAMEX, com apoio ideológico tanto do governo, que não perde uma chance de aparentemente se opor aos EUA, quanto dos 'sindicatos de empresários', que não perdem uma chance de se livrar da competição estrangeira através de tarifas.


Esta medida provavelmente seja mais simbólica do que qualquer outra coisa, já que a importação de produtos americanos hoje é pequena. Mas é sempre bem-vinda a discussão sobre este tema, que não lembro de ter visto em outras ocasiões. Parte da opinião pública está mais informada quanto a este tema, muito mais do que os comentaristas pagos para isso, embora a maioria dos comentários do Globo mostram que o nível intelectual do brasileiro continua beirando o chão.

Eles não entendem que, na 'retaliação contra os EUA', os punidos são eles mesmos. O governo americano ferra com o consumidor americano e com o produtor de algodão brasileiro para proteger o mercado do poderoso lobby do algodão americano. E em 'retaliação', o governo brasileiro ferra com o consumidor brasileiro, e ferra com produtores americanos de produtos escolhidos a dedo pelos industriais brasileiros.

Antes de mais nada, dois efeitos perversos gratificam o 'Brasil' que realmente se deu bem nesta operação. O governo do Brasil arrecada mais impostos. E o empresário protegido também se dá bem. O consumidor se ferra, mas ele é só um idiota que está torcendo nesta briga lá da arquibancada, com uma bandeira do Brasil na mão. Ele vibra com cada golpe que "o Brasil" dá na cara dele mesmo, para castigar o exportador americano por tabela.

Agora, se estes incentivos não são nada nobres e são efeitos colaterais da guerra de tarifas, qual seria então a justificativa racional? Que o McDonalds se torne mais poderoso do que o lobby do algodão nos EUA e cancele suas políticas porque seu molho ficou mais caro? É óbvio que isso jamais vai acontecer. Se tem alguém que deveria ser retaliado é o lobby do algodão, mas isso não é fácil.

A lista de produtos até tenta conectar essa cadeia, e coloca na lista produtos 'derivados de algodão'. Mas, e daí? O Brasil não importa estes produtos.

E, no final das contas, o governo americano sempre poderá dizer que, na média, os impostos sobre produtos importados são bem, bem menores do que os do Brasil. Os consumidores americanos são os mais privilegiados do mundo. Basta ver os preços por lá para comprovar isso. É capaz até de produtos brasileiros custarem menos lá do que aqui.

Não tem país do mundo que eu conheça que iguale o Brasil em tarifas absurdas de importação como estas de 30%, 60%, 100%. Isso não existe mais no mundo. Na média, é 20% de tarifa. Sem falar que os países ricos formam blocos de comércio, e possuem acordos de tarifas, muito mais do que esta piada que é o Mercosul, o nosso anti-bloco comercial. Estes órgãos todos não tem autoridade nenhuma para decidir que 'o Brasil não precisa' de tal e tal produto, jogando alíquotas nas alturas. Mas infelizmente o brasileiro, sem o saber, é um escravo feliz e fica do lado do seu patrão: industriais e governo, parceiros na fazendinha.

Por exemplo, todo este chilique contra investidores estrangeiros "tomando o NOSSO BRASIL", toda esta retórica patética nada mais é do que um chega-pra-lá da elite política e econômica nacional, dizendo para o estrangeiro nem tentar vir para cá roubar os nossos escravinhos, pois esta fazenda tem dono. O escravinho vibra de emoção ao ouvir este discurso. E se o demagogo disser para ele que o americano malvado quer explorar ele, é bem capaz dele acreditar.

Estes estrangeiros aumentariam a demanda por mão-de-obra, mudariam as regras estabelecidas do jogo. Botariam pavor no empresariado nacional acostumado com esquemas e regalias. Assim como a Azul está fazendo, por causa de um detalhe técnico (seu fundador nasceu no Brasil).

Mas em qualquer assunto que divida EUA e Brasil, sempre será possível ao político oportunista 'jogar para a platéia' e tomar uma posição contra EUA. Sempre haverá uma penca de doutrinados terceiros-mundistas para aplaudir. Só que agora que o Brasil pretende ser um país sério e parte do jogo mundial de poder, não dá pra tomar posturas como essa. Porque às vezes contrariar os EUA é a posição correta e outras vezes significa ser contra o consumidor brasileiro, ser a favor de ditaduras, ser contra os direitos mais básicos.

10 de março de 2010

Especulação e volatilidade

No Estadão de hoje: Na entrevista decisiva que teve com o presidente George Bush antes de ser indicado para presidir o Federal Reserve Ben Bernanke enfrentou a questão da especulação.
Bush perguntou a Bernanke até que ponto a especulação produz volatilidade no mercado financeiro. Bernanke respondeu que a maioria dos estudos sobre o assunto demonstra o contrário, que a especulação reduz a volatilidade.
É o que está no livro “Nos Bastidores da Crise” (Editora Campus), do editor do Wall Street Journal, David Wessel.

9 de março de 2010

A resposta veio rápida: Lula compara prisioneiros políticos à bandidos presos de São Paulo

http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,greve-de-fome-nao-e-valida-para-libertar-dissidentes--diz-lula,521849,0.htm


"Eu penso que a greve de fome não pode ser usada como um pretexto de direitos humanos para libertar as pessoas. Imagine se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrassem em greve de fome e pedissem liberdade", disse o presidente.

Lula também pediu respeito às determinações da justiça cubana sobre detenção dos dissidentes que estão em greve de fome, um dos quais morreu.

"Temos que respeitar a determinação da justiça e do governo cubanos, como quero que respeitem o Brasil", afirmou Lula em uma entrevista à AP.

Suas declarações foram feitas no momento em que o dissidente cubano Guillermo Fariñas se mantém em greve de fome desde 24 de fevereiro na cidade de Santa Clara.


Comento: Está aí a verdadeira face do 'Lulismo', que alguns empresários e setores no Brasil que teoricamente tem mais a perder do que eu toleram e citam como 'pragmatismo' em relação ao radicalismo petista. Não dá pra tolerar petismo.



Lula futuro nobel da paz?

Está aí uma grande oportunidade para um oportunista, Lula. Só precisaria fazer um pequeno esforço e apoiado na camaradagem e na grana brasileira que NÓS botamos em Cuba, pressionar o regime cubano a sair da era das trevas e parar de colocar na cadeia quem comete o crime de 'desacato à autoridade', que em Cuba significa até mesmo pixações ou adulteração de cartazes do governo. Entre outros absurdos crimes de pensamento. Trezentos prisioneiros políticos em prisões cubanas. Decisão na qual está solidária grande parte da esquerda latina.

Poderíamos ver então se o PT é mais lulista ou mais comunista, se os esquerdistas latinos preferem ter um modelo para o futuro, ou continuar a se apegar aos modelos autoritários do passado - e neste último caso, que assumam, pois não seria mais possível fingir que são atores políticos 'normais' dentro da democracia.

E também mostraria se o petismo seria capaz, surpreendentetemente, de trazer algum bem para a humanidade. É recomendável aguardar sentado.

8 de março de 2010

Toma forma proposta de 'FME', um 'fundo monetário europeu'

Mais uma vitória da política e das necessidades práticas de se consertar uma coisa que já começou errada. A iniciativa ganha impulso político sem apoio do banco central europeu. A alternativa seria inimaginável para os europeus: países em má condição fiscal tendo que deixar o euro e causando uma situação semelhante ao que aconteceu no Brasil e Argentina no final dos anos 90, quando as moedas saíram da paridade com o dólar.

http://www.nytimes.com/2010/03/09/business/global/09iht-euro.html

5 de março de 2010

Os engenheiros do pesadelo

Esta reportagem do Valor Econômico relembra o pesadelo total que era a economia Brasileira nos governos Sarney, mas principalmente no governo Collor, onde economistas despreparados sentaram na cadeirinha mágica e fizeram um dos maiores abusos cometidos na história do Brasil: o confisco de poupanças do 'Plano Collor'.

http://www.valoronline.com.br/?impresso/cultura/92/6138434/pesadelos-em-serie&utm_source=newsletter&utm_medium=manha_05032010&utm_campaign=informativo

Se havia 'liquidez em excesso', era porque o estado brasileiro gastava o que não tinha, emitindo títulos que eram 'comprados' pelo BC com dinheiro fresco. A emissão de moeda fiat é completamente relacionada com os títulos públicos e com as finanças do governo. Mas não, ao invés de fazer cortes, resolveram congelar a grana da dona Maria...

Depois do fracasso total, Collor começou a ser melhor aconselhado e partiu para a liquidação de ativos do governo federal, privatizações, demolição de indústrias protegidas. Não tem jeito de empurrar com a barriga. Quando o estado quebra, é só assim mesmo. Entretanto, o prejuízo já estava feito. Quantos negócios e quantas famílias quebraram nesta época.

4 de março de 2010

Socialismo para os inimigos, capitalismo para os amigos

A revista 'The Economist' publicou um apanhado geral da situação de extrema corrupção e vínculos entre o casal K e alguns empresários, geralmente aliados de longa data, que desfrutam de privilégios muito especiais.

A estratégia do casal K é a de assumir controle no que for possível, através de privatizações para os amigos, e ao mesmo tempo criar um clima de insegurança jurídica que obrigue empresas na Argentina a sentar e conversar com certos intermediários dentro do governo.

Ou seja, botam fogo no circo, estacionam os carros de bombeiro do lado, e negociam sua compra.

Fantasias de Paul Krugman

Paul Krugman resolve defender a tese de que os 'chicago boys', ao contrário do que se pensa, não ajudaram em nada no progresso econômico do Chile.
http://blogs.estadao.com.br/paul-krugman/2010/03/03/fantasias-dos-chicago-boys/

Comento:

É óbvio que reformas institucionais levam tempo. O sr. Krugman parece estar muito irritado com as críticas ao Obama nos Eua, além de ter sua disputa histórica com Milton Friedman. Mas o fato é que reformas liberais realmente descolaram o Chile do resto da América Latina.

Talvez ajude analisar o gráfico inteiro:
http://en.wikipedia.org/wiki/File:GDP_per_capita_LA-Chile.png

E não só em termos de renda, pois a renda do Chile ainda é compatível com a de um país de base latina, mas especialmente na maneira de encarar governo e a economia. Assim como o Brasil é um país em desenvolvimento, o Chile também é, porém com uma base mais sólida, avançando em outro rumo.

O Sr. Krugman fala como se instituições sólidas e uma postura realista em relação ao mercado mundial NADA tivessem a ver com o progresso econômico. E como se a diluição do liberalismo é que, aí sim, rendesse resultados – aí não há necessidade de comprovação, pois esta é a resposta que queríamos ouvir.

Concordo que a crítica à Obama é precipitada. Acredito que daqui a 15 anos os EUA continuará um país rico e bem capaz de resistir terremotos, mas com fissuras profundas em suas contas públicas causadas pela gestão Bush, Obama e outras semelhantes na demagogia feita com o dinheiro dos outros.

Políticos tem este poder, de surfar na onda criada por outros ou deixar bombas de efeito retardado que explodem 10 anos na frente.


2 de março de 2010

Brazil, Iran: A Troublesome Relationship for the U.S.

Trecho do artigo "Brazil, Iran: A Troublesome Relationship for the U.S." incluido no site Stratfort Global Intellicence.

"A comunidade brasileira de negócios ainda não reagiu de maneira firme diante dos flertes diplomáticos de Lula da Silva com Teerã, mas quanto mais da Silva avançar nesse sentido, mais problemas ele poderia criar para os empresários brasileiros que estão integrados de forma acentuada com o Ocidente. Nessa linha, é importante esperar sinais de que os Estados Unidos procurarão retaliar onde dói mais o Brasil: em seu bolso. Já aconteceram conversações em Washington sobre restrições ao acesso a financiamentos norte-americanos em petróleo e gás natural; e, num momento em que o Brasil tem grandes esperanças nesse setor, o afastamento dos Estados Unidos e de suas empresas de alta tecnologia poderia tornar-se um sério obstáculo."

1 de março de 2010

Instituto federalista faz uma interessante proposta para o Distrito Federal

Brasília – que tal ser apenas a Capital?

http://www.if.org.br/editorial.php

Reflexões sobre o oportunismo na desgraça, entre o estado e a anarquia

Todo liberal às vezes tem uma recaída anarquista. Nós vemos diariamente tantas injustiças, situações de abuso de poder do estado, e dificuldades artificiais causadas pela burocracia e má-vontade estatal, que às vezes acreditamos que seria muito mais fácil viver em uma anarquia ou até mesmo pagar de vez proteção para criminosos, que pelo menos cuidariam de seus negócios e deixariam você em paz nas outras inúmeras áreas que o estado oficial acaba se metendo por oportunismo.

Mas episódios como este do Chile me lembram qual é o papel fundamental do estado. A manutenção contínua da lei e da ordem, especialmente em momentos como este. A organização da sociedade após uma catástrofe destas proporções exige um certo grau de controle e até de autoritarismo. Deixados por si só em situações que não se repetem, os indivíduos são, em geral, oportunistas e destrutivos. Uma comunidade em tempos normais tem uma certa estabilidade e é praticamente auto-gerida. Mas na catástrofe, é comum assistirmos à suspensão total dos freios naturais do ser humano, a suspensão das regras. É necessária uma postura firme para mostrar que catástrofes naturais não suspendem o império da lei.

Em teoria dos jogos, se estuda bastante jogos que simbolizam a cooperação ou trapaças mútuas entre indivíduos. A conclusão da teoria é interessante: jogos repetidos tendem ao 'tit-for-tat'. A cooperação é incentivada, e a trapaça é severamente punida, pelo menos por um certo tempo. Este sistema, mesmo em um modelo simples de interação entre indivíduos, é o que apresenta melhor resultado para todos. Mas é ingênuo acreditar que a sociedade não esteja cheia de trapaceiros! Em sociedades pequenas, os trapaceiros eram expostos, ou controlados por pressão social.

Hoje, pressão social faz pouco efeito, ninguém mais acredita em punições divinas, e, infelizmente, apenas a lei restou, como mecanismo capaz de colocar um freio nos instintos mais primitivos que subsistem no ser humano, mesmo em uma sociedade avançada. E a lei necessita de um órgão como o estado para ser aplicada.

Episódios de catástrofe nos ilustram que, sem uma reação vigorosa do estado ou alguma agência análoga, em uma ou duas semanas a sociedade entra em um estado de barbárie. E levaria vários anos até uma nova organização surgir espontaneamente, e ao final do processo, assumir o posto de autoridade inconteste.

Por isso, não é realista imaginar que o estado seja algo evitável. Ele é uma organização orgânica que surge naturalmente, por oportunismo e pela necessidade de canalizar este impulso saqueador do ser humano. Uma anarquia pacífica só me parece possível com a existência destes freios morais religiosos ou de grupos étnicos.

Entretanto, se o estado é absolutamente necessário, não há porque desfrutar de confiança demasiada. O estado não neutraliza o 'DNA ruim' da espécie humana. E como o estado desfruta de alguma credibilidade, há sempre o risco dos bárbaros passarem a 'pilotar' a estrutura estatal, e serem respeitados e obedecidos, ao invés de serem tratados como os criminosos que são. Isto aconteceu repetidas vezes na história.

As reuniões das Nações Unidas, por exemplo, onde comparecem dezenas de 'presidentes' de nações extremamente frágeis, dominadas por grupos políticas locais, mais se assemelham à uma reunião entre mafiosos do que entre chefes de estado. A maioria dos estados do mundo não merecem apoio e respeito de ninguém. Inclua aí a maioria dos estados africanos, alguns da Ásia e Oriente Médio e metade dos da América Latina.

Certamente no caso do estado chileno, há autoridade moral para coordenar a sociedade em um momento de crise, e nesta iniciativa eles merecem o nosso apoio.

Mas, mesmo na melhor das hipóteses, o estado é formado por pessoas em sua maioria honestas, porém falíveis, e não de super-homens com poderes especiais. Na verdade, é formado por pessoas mais falíveis do que a média, por causa do modo monopolista no qual o estado opera.

Por isso, sempre é recomendável nutrir pelo estado desconfiança. Está aí sendo divulgado o erro fatal da marinha chilena que descartou a possibilidade de tsunamis, que no final, acabaram causando mais destruição e mortes do que o próprio terremoto.

Como passei um tempo na europa, fiquei admirado, e posteriormente chocado, com a confiança cega que as pessoas passam a depositar em seus estados. Como é possível que confiem em estruturas de poder que há não muito tempo atrás mandaram grande parte de suas populações para a guerra e para o extermínio? Mas a estabilidade política traz esta confiança exacerbada. E aí quando outros tsunamis aparecem sem aviso, a população fica completamente chocada.

Clima de pânico ajudou, diz Warren Buffett

No sábado, Warren E. Buffet, o mais famoso investidor dos Estados Unidos, transmitiu confiança em sua carta anual endereçada aos acionistas de sua holding, explicando em termos tipicamente coloridos como suas empresas tinham sobrevivido à calamidade da crise financeira. O tom da carta era muito diferente daquele presente no relatório publicado por Buffet no ano passado, no qual ele responsabilizava a si mesmo pelo declínio no valor contábil da empresa, o segundo registrado desde que ele assumiu o seu controle em 1965.
Desta vez ele explicou como utilizou os últimos 18 meses para adquirir uma série de ativos – uma ida às compras que culminou no acordo de aquisição da Burlington Northern Santa Fe Railway, no fim do ano passado, a maior compra já realizada por ele. Buffett escreveu que sua empresa, a Berkshire Hathaway, teve uma renda líquida de US$ 8,1 bilhões no ano passado, uma alta de 61% em relação a 2008. A empresa registrou um aumento de 19,8% em seu valor contábil.
A crise de 2007-2008 levou a empresa a registrar pela primeira vez uma perda operacional, no primeiro trimestre do ano passado, levando a perguntas quanto à exposição de Buffett aos gastos do consumidor e ao mercado imobiliário. Entretanto, a empresa apresentou uma recuperação forte ainda naquele ano, ajudada por uma reversão na tendência do mercado de ações. Na carta, que acompanha o relatório anual da companhia, Buffett detalhou quantas de suas holdings dependiam da demanda por imóveis e do gasto dos consumidores. Mas as ações da empresa, que no fim de 2007 chegaram ao preço máximo de US$ 148.220 e depois caíram para cerca de US$ 73.195, registraram desde então uma recuperação expressiva, fechando em US$ 119.800 na sexta feira. “O período foi ideal para os investidores: um clima de pânico é o melhor amigo deles.”
Graham Bowley THE NEW YORK TIMES

Comento: É preciso ler dois livros para entender como funciona os investimentos do Warren Buffett. São eles: "O Investidor Inteligente", de Benjamin Graham (Nova Fronteira, 2007), e "A Bola de Neve", de Alice Schroeder (Sextante, 2008). O primeiro é uma bíblia do investimento e a primeira edição é de 1949. Infelizmente nas livrarias as pessoas só encontram livros de auto-ajuda para investimentos, mas eles servem apenas para motivar. No livro do Graham são enfatisados os conceitos de margem de segurança, ou seja, quanto melhor os fundamentos da empresa e quanto menor for o seu valor intrínseco, maior a probabilidade de obtenção de retorno a médio e longo prazo. O segundo livro, conta a trajetória de vida do Buffett, mas mesmo assim, é ótimo para entender como ele investe nas empresas. Inclusive, sugiro ler o livro do Graham primeiro, pois assim será mais proveitoso entender como ele comprava empresas quando elas valiam "baganas de cigarro". Interessante também constatar que em 2003, ele já alertava para os problemas como os derivativos. Na "minha livraria", a estande de investimento teria somente esses dois livros!
Outro detalhe interessante é o valor de cada ação da Berkshire Hathaway: US$ 119.800. Segundo Buffett, o desdobramento ou bonificação das ações é uma grande besteira. Quando uma empresa é boa ela não precisa de um valor acessível para o grande público para ter liquidez. É como se cada ação da Gerdau fosse negociada a R$ 240.000,00!