Assistimos ontem na UFSC a um debate sobre a crise da europa sem muito debate, em que um dos palestrantes, aparentemente saído do museu econômico em que se tornou a universidade, dava um ponto-de-vista marxista e de acordo com a teoria da dependência. Aquela mesma do 'esqueçam o que eu escrevi'.
Uma primeira observação é a eterna fixação desta escola econômica, se é que podemos chamá-la assim, com a industrialização.
A acumulação de capital humano pode se dar em uma sociedade por uma especialização na indústria. Da mesma maneira, muitas nações possuem no comércio e nos serviços de alto valor seus maiores produtos. Da mesma maneira, a extração de commodities hoje também é especializada, dependendo de capital humano bastante capacitado.
Mas esqueça isto. Os desenvolvimentistas aparentemente acreditam ainda em um mundo onde o progresso material é produzido na linha de montagem, e onde os EUA ainda é uma grande potência industrial, capitaneada por GM, Boeing, Ford, que segundo eles, não são os elefantes-brancos que lemos nos jornais, mas sim detentores de tecnologias avançadas. E a China? Ora, você não sabe? A China é dependente da transferência de tecnologia das grandes empresas americanas.
E eu que achava que seis meses depois, independente da vontade dos 'países imperialistas', os chineses copiavam os produtos desenvolvidos na Califórnia ou as coleções de moda lançadas na Europa e lançavam seus clones, 3x mais baratos. E nisto não são nada diferentes de Japão, Estados Unidos e a própria Inglaterra, que em algum estágio de seu desenvolvimento viviam de copiar os métodos e invenções dos outros. E a Coréia do Sul? Ora, não me mencionem a Coréia, deve dizer o professor aos seus alunos. Nem Malásia, Taiwan, Hong Kong, nem Cingapura.
O professor desdenha a tranferência industrial para a Ásia: o verdadeiro desenvolvimento dependeria não da transferência das fábricas, mas da tecnologia. Pouco importa para estes pensadores marxistas o fato de que patentes tenham validade local e possam ser facilmente ignoradas, e que uma linha de produção possa ser facilmente copiada, e que isto ocorre na China até com patrocínio estatal, no esquema de 'joint-ventures' em que uma empresa chinesa se instala ao lado da estrangeira, copiando todo seu processo.
A observação de que Índia e China provavelmente já tenham mais PhDs do que os EUA também não importa para eles. Estes pensadores marxistas, sem experiência de trabalho ou com o mundo prático, pensam que tecnologia é como bomba nuclear ou super-jatos: um segredo militar protegido a sete chaves pelas potências imperialistas, e não técnicas disponíveis até mesmo de graça pela internet a quem quer que tenha curiosidade, inteligência, e a capacidade de fazer bom uso destas informações.
Pelo visto não é o caso dos pobres universitários brasileiros, que para obter um diploma universitário de qualidade cada vez pior, se trancam por um semestre em uma sala de aula que mais se parece com uma cápsula do tempo.
Pouco importa a estes pensadores também que empresários nerds indianos e chineses, fora de seus países de origem, já estejam na linha de frente tecnológica, ajudando a fundar empresas de tecnologia. Parece algo inconcebível para esta escola de pensamento que um árabe, um brasileiro ou um grego possam desenvolver tecnologias avançadas na Califórnia, Canadá ou na Europa e um belo dia resolver se instalar no Brasil ou outro país emergente, levando todo este conhecimento tecnológico com eles. No modelo deles, a roda precisa ser eternamente reinventada localmente.
No mundo de soma zero dos economistas marxistas, há o grupo dos países do centro, eternamente formado por Inglaterra, EUA, Japão, Alemanha, e os países da periferia formados por todos os outros. Como é que entra na cabeça destes economistas que o mundo mudou - como sempre acontece - e tudo virou de ponta-cabeça, e que a China financia EUA, o governo do Japão está falido e em breve se juntará ao colapso da 'periferia' da europa, e a Inglaterra também tenha se transformado em um membro honorário do grupo dos PIIGS?
Neste paradigma, a crise européia se explica de modo extremamente simples, simplório, simplista: os países do centro exploram os da periferia e precipitam seu colapso, e a burguesia não consegue romper barreiras nacionais e acaba por acentuar as concentrações de renda. Os imperialistas alemães sangraram a Grécia até o colapso. Apenas um isolamento pode trazer o desenvolvimento industrial ao povo grego. Decerto como ocorreu na isolada Albânia.
A grande atração deste modelo centro-periferia é sua simplicidade colegial. Além do fato de servir como material de agitação ideológica. Ele não explica muito bem a realidade, mas para que absorver conceitos complicados quando a teoria econômica pode se transformar num confronto do bem contra o mal e de nós contra eles?
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